Foram com essas palavras que Fabio Schvartsman, atual CEO da Vale, assumiu seu cargo no dia 22 de maio de 2017 – pouco depois do trágico crime ambiental que abalou a cidade de Mariana.
Na época não morava mais em Mariana, pois já tinha me despedido de lá – já havia me formado em Jornalismo pela Universidade Federal de Ouro Preto.
Estudei no ICSA, Instituto de Ciências Sociais Aplicadas, que fica no Centro Histórico, de Mariana.
Mas, mesmo distante corporalmente da cidade, acompanhei atentamente os relatos do crime ambiental, dia a dia, e em alguns momentos com medo.
Entrei em contato com meus amigos mineiros – ainda tenho muitos amigos em Mariana e em sua vizinha Ouro Preto – para entender o que estava acontecendo e para saber se estava tudo bem.
Para meu alívio, todos estavam bem.
Mas havia uma preocupação maior, que era em relação a uma amiga, que havia trabalhado em uma terceirizada da Samarco. E não sabia se tinha voltado a trabalhar no local.
Para meu alívio, não tinha.
Mas ela me contou uma curiosa história posteriormente, quando nos sentamos – em minha última visita a Mariana – no Bar do Messias (que não sei se ainda está aberto…) e ela me relatou o seguinte:
“Eu trabalhei naquela barragem (referindo-se a Fundão) e morria de medo. Porque ela tremia. E todos sabíamos que em algum momento ela iria estourar. Cheguei inclusive a intimar meus superiores: “me mandem embora, mas eu não trabalho, em hipótese alguma em cima daquela barragem”.”
uma amiga que trabalhou na barragem de Fundão
É realmente revoltante, não?
Porém, se não me falha a memória, na mesma conversa ela me relatou que a Samarco “estava fazendo de tudo” para que houvesse a restauração do meio ambiente. O que de certa forma, aplacou meu incômodo naquele papo de boteco.
Porém, durante minhas pesquisas posteriores, descobri ainda que muitas famílias, até hoje, não foram devidamente realocadas, que o processo contra a Samarco havia sido suspenso (ao menos por algum momento foi…) e que ninguém foi preso.
Isso me remete a uma triste anedota recente, permitam-me: ontem, conversando com minha irmã, ela me relatou que assistiu a uma entrevista de pescadores que exerciam sua atividade no Paraopeba – agora, atingido pela Córrego do Feijão, em Brumadinho – e eles reclamavam indignados para a repórter:
“Eu acho um absurdo: se a gente pesca piaba, é preso. Mas se eles (a Vale) destróem o rio inteiro, ninguém vai”.
pescador indignado
Enfim, se ninguém vai, eu não sei. Mas que até agora ninguém foi, isso é fato.
Além do mais, depois do caso de Mariana, conversei com engenheiros e demais especialistas no setor e sempre o termo “boa engenharia” surgia nas discussões.
E se há uma “boa engenharia”, presumo, portanto, que há uma “má engenharia”.
Durante as explicações, que não eram muito complicadas, a situação dirigia-se por uma bifurcação bem clara: entre fazer o que é correto, ou não.
A má engenharia tem seus processos: compra de auditores, criação de relatórios deliberadamente incorretos de intermediários para alta gestão (com a finalidade de “não dar dor de cabeça para o chefe”), desvios de recursos dentro da própria empresa (ou vamos supor que a corrupção atinge apenas o setor público?), ordens por parte de altos gestores para “espremer o orçamento”, entre outros.
E assim se sucede uma cadeia de irresponsabilidades consecutivas, uma verdadeira panacéia do mal, que acaba resultando em mortes.
Além das mortes, o que é algo que deixa qualquer um, com um mínimo de empatia, perplexo, há que se considerar outros danos colaterais gravíssimos. Tomando Mariana, por exemplo:
- Conforme relatado, muitas famílias não foram realocadas até hoje;
- O índice de depressão subiu entre os moradores sobreviventes de Bento Rodrigues, devido à dificuldade com a adaptação;
- Populações ribeirinhas tiveram suas atividades econômicas extintas porque dependiam do Rio Doce;
- Há grandes resquícios do rejeito de Fundão ainda no Rio Doce;
Entre outros fatos.
De qualquer forma, voltando-se para o rompimento da barragem, de Brumadinho, é perceptível que esse segundo – e ainda mais trágico crime ambiental – é fruto do primeiro.
E, dessa vez não será diferente: o sofrimento será estendido por anos – seja pelo luto ou pela escassez de recursos provocada pelo gravíssimo dano ambiental.
E certamente, caso as devidas medidas judiciais não sejam tomadas, haveremos de lidar com um terceiro – lembrando que, ainda ontem, uma das sirenes tocou em Brumadinho, porque outra barragem – com maior poder destrutivo – poderia ter se rompido.
Mas a pergunta que não se quer calar é bem simples:
VALE a pena?