Turismo Em Minas Gerais: Lendas E Histórias Da Quaresma

A quaresma é uma época misteriosa e um tanto quanto sombria. Lendas povoam o imaginário das pessoas. Em especial nessa época, quando as ruas ficam mais desertas e silenciosas. Nas cidades do interior especialmente (e isso influencia o turismo em Minas Gerais), este tempo é muito levado a sério: as pessoas evitam carne vermelha e sair de casa tarde, por questão de respeito e medo de encontrar algo sobrenatural nas ruas.

Porém, hoje em dia, a Quaresma não é tão levada à risca como antigamente, quando as pessoas não podiam nem assoviar, varrer a casa e, muito menos, ouvir canções na rádio. Mas o mistério e rituais permanecem.

Em Mariana há varias lendas de fantasmas, sacis, mula sem cabeça, vozes e correntes sombrias e invisíveis que são arrastadas pelo chão. Em partes, existe até mesmo um fomento do turismo em Minas Gerais por conta dessa arraigada cultura local.

Nesse contexto, sempre fui envolvida por histórias fantasmagóricas de Mariana e Ouro Preto, sendo contadas pelos meus avós e meus pais. De todas elas, há duas que sempre permaneceram em minha memória, desde quando as ouvi lá na minha infância.

E serão estas duas histórias que irei contar agora e foram passadas de geração em geração dentro da minha família, até se desenrolarem de boca em boca pelas ruas marianenses e se tornarem parte das lendas locais. Assim como acontece em outras famílias também, o que não poderia ser diferente em se tratando das famílias mineiras interioranas. Acompanhe:

O baile amaldiçoado e gigante sombrio

Aqui teria visto o baile assombrado
Meu avô teria visto o baile amaldiçoado logo depois que passou por esta ponte

Tudo começa na quarta-feira de cinzas dos idos de 1940. Antigamente, as festas de Carnaval eram bailes dentro de clubes e na rua só tinha desfile de blocos e escolas de samba.

A partir da meia noite, da terça de Carnaval para a quarta de cinzas, o sino da Igreja tratava de avisar quando a quaresma chegava e, por isso, os organizadores dos bailes, por questão de respeito e medo também, finalizavam a farra às 23h30min.

O procedimento era realizado para dar tempo aos foliões chegarem sãos e salvos em casa sem cruzar com alguma criatura maligna pelo caminho.

Mas sempre tem aquele atrasado da turma, não é mesmo?

Ainda mais se tratando de festa carnavalesca. E em um desses carnavais, o meu avô, seu Antônio, era um desses. Ele, que já é falecido, contava que, neste dia, contrariando o pedido de sua mãe, minha bisavó, ele resolveu sair do baile às 23h47, (como ele pontualmente dizia).

A sábia ideia era fazer uma horinha para aproveitar um pouco mais do último dia de Carnaval, festa que ele tanto gostava, pois sua casa era no bairro da Chácara, pertinho do centro histórico – local onde houve a farra.

Assim, daria tempo de chegar à casa um pouquinho antes da meia-noite, pensou.

Mas as coisas não se sucederam muito bem…

Assim que ele saiu do baile já não havia uma viva alma nas ruas (já mortas…), por conta do medo de encontrar o próprio capeta ou outro personagem lendário. Quando saiu do baile, logo meu avô sentiu um arrepio e um frio na espinha ao iniciar o trajeto de volta para casa, na Rua Dom Viçoso – uma longa rua que liga o Jardim de Mariana até o bairro da Chácara.

Já próximo ao casarão mais antigo do bairro da Chácara, na época abandonado, que se localiza em frente à ponte local, o sino da Igreja Matriz da Sé se fez ouvir badalando meia-noite em ponto. No mesmo minuto, meu avô começou a ouvir vozes vindas do casarão e, ao olhar para a mansão sombria, viu luzes acesas e várias pessoas com roupas de época, estilo século XVIII, conversando, rindo e bebendo como se estivessem em um baile de Carnaval de época.

Meu avô então correu desesperado para chegar mais rápido em casa e seu arrepio e tremores só aumentavam e denunciavam algo sobrenatural muito pior, que estava por vir. Ao olhar novamente para trás já não havia absolutamente mais nada no casarão. Tudo cessara: as vozes, pessoas e a luz. Tudo estava medonhamente escuro e silencioso como antes.

O melhor está por vir

Então, de repente, surgiu um homem gigante de aproximadamente 3 metros de altura. Este, para sofrimento de meu avô, tinha larga vantagem em suas passadas: para cada cinco passos dados pelo meu avô, dois eram suficientes para o gigante alcança-lo. Então meu avô começou a rezar o Pai Nosso e a oração do Credo, enquanto corria, até chegar em sua casa.

Ao chegar, ele então trancou a porta e desmaiou no meio da sala. Ao ser acordado pela minha bisavó, ele contou o que houve e ela lhe disse que quando ele entrou em casa e desmaiou, ela ouviu passos muito altos e fortes do lado de fora da casa e sentiu o mesmo arrepio sombrio.

A sua mãe, que era uma mulher muito religiosa, disse ao meu avô que o que ele viu era o capiroto, pois, segundo ela, ele consegue tomar várias formas para assustar aqueles que desobedecem ao sair de casa em épocas e horários impróprios.

Para que meu avô nunca mais se deparasse com algo do tipo, ela pediu que meu avô rezasse e nunca mais a desobedecesse, chegando sempre em casa antes da meia-noite em época de Quaresma. Principalmente na quarta-feira de cinzas. Obviamente depois do susto, meu avô nunca mais a desobedeceu.

E se você encontrasse o saci em pessoa?

Cemitério onde o saci foi avistado
Foi na frente deste cemitério onde a amiga de minha avó teria visto o saci em pessoa!!!

A segunda história foi contada a mim pela minha avó, dona Dalva, que teve uma amiga que saiu da madrugada de terça-feira para quarta de cinzas, lá pelos idos dos anos 50. Ela fez como meu avô: saiu tarde do baile de Carnaval do antigo Clube Maracatu, que se localizava na Praça da Sé, ao lado do Casarão, onde hoje está o Banco Itaú de Mariana.

Ao voltar para a sua casa sozinha, que ficava na Rua de Sant’ana e, por ironia do destino, era bem em frente ao cemitério do Sant’ana, ela avistou o próprio Saci Pererê (!!!). Com um cachimbo na mão, camiseta e bermuda bem vermelhas e lábios enormes, na escadaria da entrada principal do cemitério, bem em frente ao portão, pulando todo feliz com uma perna só e cantando a seguinte marchinha de Carnaval: “Tá bom, tá bom, tá bom? Tá! Comecei a brincadeira sexta-feiraaaaa e fui acabar na quarta-feira.”

Diz ela que saiu correndo e gritando pela Rua Sant’ana e, para a sua sorte, sua família a esperava no portão de casa. Só não desmaiou por causa disso.

Depois dessas histórias cabulosas, mesmo você sendo um completo descrente, fica a dica para não se arriscar na Quaresma, muito menos em uma madrugada de Quarta-feira de Cinzas. Afinal de contas, não estamos em qualquer lugar. Estamos nas ladeiras e ruas históricas e sombrias de nada mais, nada menos, que as cidades históricas de Mariana e Ouro Preto. Aqui sobram mistérios e infinitas histórias. O que favorece por demais o turismo em Minas Gerais.

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